quinta-feira, 8 de março de 2012

Teste da Violência Obstétrica - Dia Internacional da Mulher - Blogagem Coletiva





Não mandarei nenhuma mensagem bonitinha sobre como nós mulheres podemos ser delicadas, lindas, charmosas e carinhosas (como se fossemos apenas isso...), mas quero lembrar o por quê desse dia ter sido instituído. Reproduzo o que foi dito em outro blog http://www.cientistaqueviroumae.com.br/2012/03/teste-da-violencia-obstetrica-dia.html


"O incêndio foi em 1911. E já se comemorava o dia internacional da mulher antes disso. Foi proposto em 1910, por uma mulher de nome Clara Zetkin. Ela propôs, em 1910, na I Conferência Internacional de Mulheres, que houvesse uma data internacional para discussão da condição de vida das mulheres. Em 1911, então, passou-se a comemorar o Dia Internacional da Mulher. Mas não em 08 de março. Em 19 de março.

Bom, aí vem a história do incêndio. Seis dias depois da data, em 25 de março de 1911, a fábrica têxtil Triangle Shirtwaist pegou fogo e 146 mulheres,  a grande maioria costureiras, morreram queimadas. O incêndio foi considerado o pior de Nova York até o 11 de setembro.
Então, em 08 de março de 1917, seis anos depois, as operárias russas se rebelaram contra as péssimas condições de vida das mulheres, contra a exploração feminina, contra a entrada de seu país na I Guerra Mundial, foram às ruas e constituíram uma das maiores manifestações já vistas na Rússia e que foi, justamente, o marco inicial da Revolução Russa de 1917.
E hoje comemoramos, em 08 de março, o Dia Internacional da Mulher. Então quando se diz que é uma data de luta, não é papo de ativista não. É, mesmo, uma data de luta."

Aliás, um filme que retrata bem a situação da mulher trabalhadora poucas décadas atrás é Terra Fria, com a Charlize Theron. Fica a dica!
(trailer: http://www.youtube.com/watch?v=8VwRutCDloc&feature=related)

Então hoje é dia da mulher e bla bla bla, mas ao invés de distribuir “parabéns” de forma vazia, distribua ações. Pense quantas vezes você apoiou discursos machistas que humilham, objetificam e diminuem a mulher, diminuem aquele ser humano. Quantas vezes você culpou uma mulher de ter sido estuprada porque estava usando saias (ao invés de culpar o estuprador que não sabe se controlar), quantas vezes você chamou uma mulher de vadia e galinha só porque ela resolveu agir como tantos homens agem, para se divertir? Quantas vezes você reduziu a mulher a um par de seios, a um corpo vazio, como uma casca sem valor?

As mulheres ainda recebem, em muitos setores da sociedade, salários menores. Tem menos chance de conseguir uma vaga de emprego, pois as empresas não querem pagar licença maternidade. Os números de abuso sexual tem apenas aumentado. Na África meninas virgens são estupradas pois acredita-se que assim alguém pode curar-se de HIV. Em diversos países crianças são sexualmente mutiladas pois às mulheres não é permitido experimentar sua sexualidade de forma saudável, ter prazer. Crianças de 12, 13 anos são vendidas como dotes de casamento; e no Brasil não é muito melhor, aqui pais também vendem suas filhas para a prostituição, quando eles mesmos não as estupram porque “provocaram com um shortinho”. Nos EUA 1 a cada 5 mulheres em ambiente universitário já foi estuprada. É comum darem drogas que “apagam” elas nas festas. Muita gente trata isso como “normal”. No Brasil recentemente uma menina de 12 anos foi estuprada no fundo de um ônibus que tinha 4 passageiros (mas ninguém viu nada). Também no Brasil jovens promoveram um estupro coletivo de algumas de suas amigas como presente de aniversário de um deles. Aliás cerca de 15 mil mulheres são estupradas por ano no Brasil (e são os casos registrados apenas). 6 a cada 10 brasileiros conhecem uma mulher que já foi vitima de violência doméstica, e muitas dessas agressões não são denunciadas pois quem está em volta considera “normal” o marido perder a cabeça e bater nela, ou não quer se meter em “briga de casal”. Ao invés de distribuir “parabéns” no dia da mulher, comece a denunciar!

Sabiam que 2/3 da força de trabalho no mundo é feminina? Nas lavouras, nos serviços domésticos, nas fábricas.. Em países como a Índia e Nepal, as mulheres são responsáveis também pela construção civil. Mas as mulheres ganham apenas 10% da renda mundial e detêm apenas 1% dos meios de produção.
2/3 das crianças que tem o acesso negado à educação são meninas. E a violência doméstica é a maior causa de lesão e morte a mulheres no mundo. E não é só em países onde é culturalmente aceitável um homem trair, e é igualmente aceitável um marido matar sua mulher se ele desconfiar que ela o traiu. (Sem contar os países onde mulheres estupradas são obrigadas a casar com seus estupradores ou serem apedrejadas por terem feito sexo antes do casamento)

É incrível pensar que apenas recentemente as mulheres foram consideradas capazes de votar, de dirigir, de ter acesso a uma educação de base e de estudar áreas que não se resumem àquelas áreas de conhecimento que até hoje ainda são, por muitos, consideradas (não por mim, que me formei em Letras) sub-areas.. as humanas da ‘letras’, ‘serviço social’ e outras. Muitos hoje perpetuam a ideia de que mulher é “burrinha” pra área exatas; e até em ambiente de jogos ouvimos “se é mulher deve jogar mal”.

Mas há outras formas de violência, algumas mais sutis, que marcam a alma. A violência promovida pela mídia é intensa e descarada. Criam padrões de beleza totalmente irreais e inatingíveis. Doutrinam através de revistas, anúncios, filmes, bonecas... fazendo as meninas se considerarem piores por não terem isso ou aquilo, criam adolescentes em constante crise consigo mesmas, não aceitando seu próprio corpo, seus cabelos, suas marcas, sua pele, pois elas veem o photshop nas “beldades” de revistas e acham que aquilo é real, mas é algo impossível. Tantas meninas aprendem desde cedo também que sem maquiagem não é possível ser bonita. E a lista de problemas segue...
Pior ainda, revistas como “playboy” mutilam digitalmente o corpo feminino. Através do photoshop (ou semelhante) apagam parte da genitália feminina para que esta fique mais “lisa e infantil”. E como a maioria das mulheres não costuma ver outras mulheres nuas, a não ser em revistas etc, passam a se acharem ‘esquisitas’, ‘defeituosas’, ‘feias’. Nos EUA é crescente o número de cirurgias plásticas “íntimas”. Temos milhares de mulheres se submetendo a procedimentos dolorosos e desnecessários pois foram levadas a desacreditar de seus próprios corpos, a se auto-condenarem. Na TV aberta no Brasil temos apresentadores misóginos fazendo piadinhas condenáveis sobre “mulher feia devia agradecer por ser estuprada”. Tudo é uma violência!
Sobre isso, sugiro a todos que vejam esse documentário (legendado em inglês) sobre a manipulação e desmembração da imagem feminina em anúncios e o impacto psicológico e social que isso tem causado (inclusive o vídeo mostra como esse tipo de manipulação começou a se estender para o universo masculino também)
http://www.youtube.com/watch?v=1ujySz-_NFQ
Não somos bundas e corpinhos bonitos para venderem cerveja nas propagandas. Somos mais!

Mas há outro tipo de violência cometida contra mulheres (e famílias). A violência obstétrica
Começa na infância, com a negação da sexualidade feminina. As meninas ouvem “fecha as pernas”, “isso é feio”.. Nega-se a autoconsciência corporal e imprime-se naquela mente ainda em formação a ideia de que é algo ‘sujo’, cercado de culpas e neuroses.
Segue então para a menarca (a primeira menstruação). Antigamente (e ainda em algumas culturas), esta era tratada como um momento importante na vida de uma menina, um rito de passagem, algo a ser celebrado. Hoje a menstruação é tratada apenas como um incômodo, um incômodo de termos que usar aquelas “fraldas” (aliás, toda mulher deveria conhecer os coletores menstruais, é uma maravilha se libertar do absorvente!), o incômodo da cólica, da negação dos próprios ciclos naturais do corpo.
Então a mulher engravida, e no pré-natal “a gestante é tratada como um objeto de estudo e não como um ser íntegro, humano e digno de tratamento individualizado e respeitoso – Quem nunca ouviu um obstetra ou uma enfermeira dizendo: “- Mãe, deita, tira a roupa e abre as pernas?” ou “-Mãe, aqui em decide o que deve ser feito sou EU. Você deve apenas obedecer aos protocolos”.
A gestante passa a não ter pleno direito sobre seu corpo, se ela se nega a obedecer cegamente a autoridade do médico é tachada de irresponsável, louca, mesmo quando este a submete a exames invasivos e desnecessários (como o exame de toque de rotina).
O abuso de poder no ambiente médico, através de humilhação, terrorismo psicológico, coerção, intimidação é algo comum, infelizmente. As mulheres são chamadas de “mãezinhas”, no diminutivo mesmo; são infantilizadas. Delas é retirado o poder, a capacidade de decisão, a liberdade sobre seus corpos, a saúde de sua gestação. Delas é roubado o protagonismo sobre seus próprios partos. E de seus maridos é roubado o direito de participar daquele momento com elas (apesar de existir uma lei do acompanhante, ela não funciona no SUS).
Tornou-se comum a frase “Dr. Fulano fez o parto..” mas quem faz o parto é a mulher! O médico assiste e intervém quando necessário.
O parto, que deveria ser outro rito de passagem, de catarse emocional, de transformação, de empoderamento, transforma-se em uma cena de terror. O que acontece nos hospitais do Brasil é comparado muitas vezes a um estupro, sim, um estupro, do corpo e da alma, tamanha a violência!
É um momento íntimo e único na vida daquela mulher, mas ela é humilhada com frases como “na hora de fazer não doeu”, “se gritar mais eu não te atendo”. Elas não podem nem expressar seus receios, sua dor. São obrigadas a abrir sua intimidade para dezenas de enfermeiras carrancudas, se sentem coagidas a aceitarem intervenções (muitas vezes desnecessárias e desrecomendadas pela OMS, mas ainda praticadas por médicos desatualizados e despreparados para partejar). São impedidas de se movimentar (muitas vezes tem as pernas amarradas) e obrigadas a ficar na posição litotômica (deitada), a mais dolorosa e inadequada para o parto, criada apenas para conforto do médico quando o parto deixou de ser um evento feminino e tornou-se uma intervenção hospitalar. Muitas vezes elas têm suas genitálias cortadas (episiotomia) a sangue frio, corte este que desde 1986 a OMS desrecomenda que seja feito. E no final, quando o bebê nasce, são impedidas de se aconchegar com ele, pois em muitos casos o bebê é levado para um berçário e também sofre intervenções violentas. O ser humano é o único mamífero que afasta a cria de sua mãe ao nascer, é lamentável!
E quando não é assim, as mulheres são enganadas por obstetras gananciosos, manipuladores, levadas a acreditar que possuem inúmeros defeitos que as torna incapazes de parir, e convencidas com desinformação a marcarem cesarianas (o que envolve 4x mais riscos para mãe e bebê, e possui inúmeras desvantagens frente ao parto normal) totalmente desnecessárias, e tem seus corpos cortados, se submetem a cirurgias que não precisavam, e sofrem todas as consequências disso devido a essa violência obstétrica institucionalizada.

E após o parto muitas mulheres são constantemente constrangidas e repreendidas por fazer algo simples como amamentar um bebê. Para muitos a amamentação é um ato obceno, e a pressão pelo desmame é vergonhosa. E para muitas é deixada a tarefa de sozinha cuidarem daquele bebê.
A violência do machismo prejudica aos homens também. Muitos pais que desejariam naturalmente participar daquele momento, de curtir seus filhos, sofrem zombaria dos amigos “você não é babá pra ficar trocando fralda suja”, “vamos pescar, deixa sua mulher ai com esse saco de choro”.

Mas não precisa ser assim, o Brasil não precisa continuar com seus mais de 50% de cesarianas (chegando a 90% na rede privada, quando a OMS recomenda que apenas 15% são necessárias). O Brasil não precisa continuar a ser um modelo de violência. Aos poucos, com a aquisição de informação e acesso a novas assistências, as mulheres passam a questionar essa realidade. Aos poucos o movimento de humanização do parto e nascimento consegue atingir mais gente, e promover o atendimento à gestante e ao parto de forma  acolhedora, promovendo um parto prazeroso e respeitoso para mãe, pai e bebê.

O Taoísmo, que embasa a Medicina Tradicional Chinesa, nos trouxe a idéia do Yin e do Yang. São opostos complementares, e possuem em si a semente do outro. O feminino e o masculino são aspectos da mesma unidade fundamental, são uma dualidade natural no mundo, que se interliga e se complementa. Como a bolinha no centro de cada cor, toda mulher tem um pouco de homem, e todo homem tem um lado feminino.


Os homens são também vítimas da sociedade embasada no machismo. Ouvem que “menino não chora” e são levados a reprimir suas emoções. São “adestrados” a serem sempre machões, provedores, insensíveis. Se um homem demonstra compaixão por um animal, poderá ouvir de outro que é “viadinho”, se um homem demonstra gentileza e empatia, poderá ouvir de outro que é “fracote”.

Com conhecimento e com o coração podemos mudar essa realidade, e chegará um dia, espero, que não será preciso um “dia da mulher” para lembrar as pessoas a serem mais respeitosas, e deixarem de praticar essa violência de gênero.

Penso, sinceramente, que quem sorri para uma mulher e diz “parabéns pelo seu dia” não entendeu o que historicamente esse dia significa. Portanto não me dê parabéns por ser mulher, não tenho mérito nenhum em ter nascido de um gênero e não de outro. Mas deixe de fomentar o machismo e a misoginia na sociedade, seja mas respeitoso, mais humano, mais empático, e claro, denuncie!

Segue abaixo um questionário. Promovemos esta blogagem coletiva em defesa dos direitos reprodutivos de todas as mulheres, em defesa de escolhas esclarecidas, de respeito às individualidades e à dignidade humana. Por uma assistência ao pré-natal e ao parto segura, e de boa qualidade.



O Teste da Violência Obstétrica ficará no ar até o dia 15 de abril. No dia 30 de abril, divulgaremos os resultados desta pesquisa informal, que tem como objetivo sensibilizar as mídias sociais e outras instâncias para a grave questão da violência obstétrica.

O teste será respondido anonimamente e os dados individuais serão confidenciais.
Participe, deixe sua contribuição!




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